Muito prazer! Sou a biblioteca.

 

            


Mais uma quinta-feira chuvosa nesse despontar de novembro. Mais uma aula de leitura com a galerinha do sexto ano. Mais uma tentativa de ajudar uma dúzia de meninas e meninos a superarem o déficit de aprendizagem que a pandemia trouxe a todos.

Nos últimos três meses, já fizemos escuta de narrativas, leitura compartilhada de textos enigmáticos, brincadeira da forca, leitura e ditado de palavras com sílabas complexas. Mas ainda não havia conseguido ver nenhum daqueles olhos cheios de vida brilharem.

“Queremos aulas diferentes”, disseram à orientação na escuta do conselho de classe. Mas como ser diferente diante da missão de ‘ensinar a ler e escrever’ em tempo recorde? Como proporcionar algo novo e legal para pré-adolescentes numa escola pública rural com parcos recursos?

Em casa, olhando a estante, pensei em levar alguns livros da coleção de Minecraft para um self servisse de leitura, mas logo desisti. Embora seja algo ‘dahora’ para essa faixa etária, se iria propor leitura literária, deveria começar em grande estilo.

Depois de muito tempo desativada, a sala que acomoda o acervo bibliográfico da escola estava sendo organizada por uma servidora para que pudéssemos voltar a frequentá-la. Sob incentivo da coordenadora pedagógica, escolhemos retomar o calendário de visitações com a turma do sexto ano.

Não nego o receio de que houvesse tumulto e que ficassem dispersos, afinal, ao lado dos banheiros, o local que visitaríamos fica bem distante do pavilhão onde funcionam as salas de aula e setor administrativo.

Na volta agitada de sempre do recreio, parei à porta calada e bem séria, aguardando que os ânimos se acalmassem no interior da sala. Logo fui indagada porque não havia entrado para a aula. Avisei que dessa vez nosso encontro seria em outro espaço da escola.

“No pátio? Está chovendo!”

Não, iríamos fazer pesquisa.

Organizados em fila, atravessamos os corredores do refeitório e dos banheiros. Eles chegaram ao destino antes de mim, mas não entraram. Parados à porta, aguardavam a autorização. Permissão concedida, passos cautelosos e olhares tímidos para aquele espaço e a servidora que ali nos aguardava.

Convidados a sentar, a timidez foi dando lugar à ansiedade e curiosidade em explorar aquele universo entre quatro paredes. Em círculo, pedi que olhassem em volta com calma. Depois que falassem o que viam.

“Organização, muitos livros, silêncio...”, foram as respostas.

Autorizados a visitarem as quatro estantes de madeira grudadas na parede, passos leves e empolgados circulavam nos pequenos corredores que aquelas fileiras de livros. Olhares atentos, curiosos, e muito cochichos.

“Aqui tem filosofia, o que é isso?”

“Olha, tem dicionários!”

“Será que tem Hary Potter?”

“Eu queria achar era revista em quadrinhos...”

Observei que as mãos deslizavam pelas pilhas de livros, como se pelo tato, pudessem descobrir o que havia no interior de cada obra. Depois de olhar até com a ponta do nariz, escolheram o que desejariam ler. Além das estantes, algumas pilhas de livros dispostas nas carteiras serviram de fonte para a investigação que faziam enquanto decidiam o que apreciar no deleite de leitura.

Ao final dos cinquenta minutos que compreendia aquela atividade. Enfim, imaginei que para fazer uma aula diferente, não precisamos de muito. Uma professora, seus alunos, livros e a vontade de ler podem levar a muitas descobertas.

Muito prazer! Sou a biblioteca.

 

 

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