A política do ‘morde-assopra’ na dinâmica neocoronelista tocantinense

Conforme os dicionários, quando se diz que determinado indivíduo “morde e assopra” significa que prejudica/magoa a outro por seus atos ofensivos, mas depois passa a agradar ao sujeito anteriormente ofendido, em gesto de desculpas no intuito de silenciar/apagar a situação desconfortável anteriormente provocada.

Máxima popular que tem referência no comportamento dos morcegos por sugarem o sangue de suas vítimas sem que estas percebam, cai como uma luva no recorrente contexto político tocantinense.

Não é que a população do caçula entre as unidades federativas seja de sanguessugas. Desde os tempos dos coronéis de capitanias hereditárias, no papel temático de eleitor, o povo aparece como vítima das mordidas suaves de seres que aparentam ser inofensivos, mas que atacam suas presas silenciosamente.

As metáforas aqui mobilizadas, servem para ilustrar o mais novo ataque que o povo do Tocantins sofreu com o bando que atua no cenário político local. No apagar das luzes e em revoada, em sessão extraordinária, deputados aprovaram o projeto de Emenda à Constituição nº 01/2023 que estabelece a reforma da previdência em âmbito estadual.

O mais interessante é que as regras do texto, que tramitou em ‘regime de urgência’, não se aplicam aos parlamentares que deliberaram sobre o tema muito menos ao chefe do executivo e seus assistentes. Pelo contrário, os mesmos parlamentares que aprovaram as medidas que prejudicam trabalhadores concederam reajuste salarial à cúpula do executivo. Mas o ponto curioso e que justifica a comparação com a mordida de morcegos é que a atual gestão estadual foi mais maquiavélica que o texto original e usou da astúcia do ‘assopra’ antes da mordida.

Antes da referida votação, a mesma gestão que propôs a matéria anunciou em páginas a fio do Diário Oficial a concessão de progressões funcionais por tempo de serviço e nível de especialização dos mesmos servidores que agora terão tempo de atuação prolongado antes da merecida aposentadoria.

Pode-se alegar que a medida não afeta 1% dos 1,55 milhão de habitantes desse recorte geográfico, porque abarca apenas servidores efetivos. Mas, considerando que pela tradição, os 139 municípios do estado costumam ser signatários das decisões contidas na Constituição Estadual, as vítimas serão multiplicadas.

Afinal, como traço hereditário das capitanias, na lógica neocoronelista praticada por aqui, se o coronel mandou, os jagunços obedecem e agem na calada da noite. E nós, povo que trabalha de sol a sol, somos presas fáceis, sentimos anestesiados os efeitos desse morde-assopra/ assopra-morde. É o corpo que sofre na carne, a sangria provocada pelas garras e dentes dos agentes nocivos a nosso organismo social.

(Kayla Pachêco, tocantinense e professora da rede estadual)

 

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